17.8.07

Número 218

CONDENADOS

 

Está na resolução n° 245 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran): a partir de agosto de 2009, todos os carros zero quilômetros deverão sair das montadoras já equipados com rastreadores e bloqueadores antifurtos. De acordo com as autoridades, tais equipamentos permitem recuperar até 90% dos veículos furtados. Com isso, ao proprietário será facultado gastar mais (contratando o controle do veículo 24 horas por dia, via satélite), ou menos (caso opte por um bloqueio simples, via celular) para buscar seu carro de volta. Prender ladrões e receptadores, aplicando corretamente os impostos, nem pensar.

 

Esta fórmula invertida de resolver o problema da segurança pública, isto é, repassando a (dupla) conta e o gerenciamento para o cidadão, poderá servir de modelo para os demais órgãos governamentais. Afinal, temos culpa de nascer no Brasil. E culpa maior em caso de mérito –   como é a situação dos afortunados que conseguem comprar um carro novo. Nos moldes do Contran, viriam estas outras resoluções:

 

Resolução da Secretaria de Obras: a partir de tal data, toda construção residencial seria obrigada a conter, em seu projeto, grades em todas as janelas e portas. Mais: cerca elétrica e arame farpado; alarme com sensores de presença em cada peça e monitoramento (operado por empresas ou via celular); canil e guarita na calçada. Afinal, mais de 90% das casas arrombadas não contam com a metade destas garantias.

 

Resolução da Secretaria de Comércio e Serviços: a partir de tal data, só receberia alvará de funcionamento o estabelecimento que apresentasse, em seu projeto, um sistema de monitoramento interno via circuito fechado de TV. Além disso, deveria conter portas com detector de metais, botões anti-pânico em locais estratégicos e guarita à prova de balas. Para o caso de bares e restaurantes, seria exigida a apresentação dos diplomas de Ninja de seus garçons; aos cozinheiros, Curso de Atirador de Facas. Heliporto e telefone vermelho dentro de uma queijeira – para falar direto com o Batman. As estatísticas indicam que mais de 90% dos casos de assalto seriam evitados com tais equipamentos.

 

Resolução do Conselho Tutelar: a partir de tal data, todo bebê que nascesse em lar brasileiro deveria ganhar uma pulseira de rastreamento via satélite. Nela, um chip programável informaria aos pais, com preços módicos, a freqüência da criança nas aulas, com quais amiguinhos ela tem andado e se foi ao banheiro hoje (e quanto tempo lá permaneceu). Para o caso das mães que trabalham fora, informaria se chegou perto do fogão e tomadas elétricas; ou mesmo se ficou todo o tempo na frente da TV. Pesquisas indicam que mais de 90% dos casos de delinqüência juvenil, acidentes domésticos e prisão de ventre seriam prevenidos.

 

Outros projetos: a obrigatoriedade de cintos de castidade para todas as mulheres, a fim de prevenir estupros. Detectores de mentira individuais, para escapar de estelionatos. Coletes à prova de bala em qualquer traje (principalmente uniformes escolares), para escapar de balas perdidas. Toque de recolher nas doze badaladas.

 

Então, no momento em que todas estas portarias entrassem em vigor – agosto de 2009, quem sabe, junto com a inspiradíssima resolução 245 do Contran –, os governantes poderiam, enfim, abrir de vez as portas das prisões. Teria sido mais fácil e barato monitorar, cercear e enjaular todo mundo.

 

Exagero ou premonição?

Um comentário:

Robertson Frizero disse...

O que realmente gosto nos teus textos, amigo Penz, é a clareza que trazes a essas ocorrências aparentemente banais do nosso cotidiano de país desgovernado com a tua forma direta de escrever, sobretudo com teus exemplos repletos de uma ironia fina e divertida.

Bem, mas já sabes que sou teu fã, não é novidade.

Mas quem será que vai sai ganhando com esses sistemas de monitoramento e bloqueio de automóveis? Vai se evitar o furto, mas para onde irão migrar os crimes?

Um grande abraço!

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